quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Marina cresce entre descontentes

Por Cândido Neto da Cunha*

Previamente, aviso que não sou eleitor de Marina Silva. Longe disto, a considero (mais um) grande engodo para desavisados. Esta minha opinião vem de longa data, desde a sua passagem pelo Ministério do Meio Ambiente ainda no governo Lula, com sua atuação na concessão das licenças ambientais para as usinas hidrelétricas do rio Madeira atropelando pareceres técnicos em contrário, a Lei de Gestão de Florestas Públicas que possibilita transferir terras públicas para madeireiras , o esfacelamento do Ibama e a liberação dos transgênicos, só para ficar na área ambiental, onde Marina seria uma “referência”. Neste sentido, vale a leitura do texto “A Rede de Marina” no blog do seringueiro Osmarino Amâncio.

Também não sou de confiar muito em pesquisas eleitorais, ainda mais essa última do Datafolha, produzida ainda sob o impacto da morte de Eduardo Campos e quando Marina ainda nem ainda era dada como um nome certo para sua substituição como candidata à Presidência.

Mas, os dados do Datafolha, ainda que levado em conta o aspecto da inconfiabilidade que inicialmente destaquei, mostram Marina como a mais nova candidatura a Presidência a ser batida. Seu nome, no momento e conforme a pesquisa torna quase certa a existência de segundo turno, coisa que não aparecia com certeza até então. Aliás, salvo engano, é a primeira vez desde 2002 que em pesquisas eleitorais para a Presidência em que o PT não aparece liderando.  Marina aparece empatada com Aécio Neves (PSDB) no primeiro turno (21% a 20%), e, no limite da margem de erro da pesquisa, supera Dilma Rousseff (PT) no segundo turno (47% a 43%).  

Feitas essas considerações iniciais, destaco que a agora confirmada candidatura de Marina é que mais sofre ataques nas redes sociais, especialmente dos petistas, que vão da crítica às fraquezas da sua candidatura até a desqualificação por meio de métodos mais baixos, os mesmos aliás por quais o PT já foi vítima no passado.

Em relação aos ataques que vem sofrendo, Marina possui dois grandes trunfos a seu favor e que também podem ajuda-la a superar a grande desvantagem que tem no tempo de TV, a menor “capilaridade política” (pra não usar um termo chulo) e as contradições (gigantescas) que sua aliança eleitoral tem: o sentimento de descontentamento de parte do eleitorado e os caminhos conservadores também adotados pelos governos do PT.

Aliás, todas as pautas conservadoras apontadas em Marina, sejam na economia, sejam em relação aos chamados direitos civis (homossexuais e direitos da mulher), não é em nada diferente das políticas concretas adotadas pelo governo Dilma, essa sim uma verdadeira “talibã fundamentalista” nas áreas ambientais, indígena e agrária, temas que ainda são identificados como símbolos em Marina.

O eleitor de Marina é no momento, conforme o próprio Datafolha, o típico eleitor petista do passado. Falando de forma generalista, é o eleitor concentrado nos grandes centros urbanos do país, possui maior escolarização, é composto por trabalhadores que recebem salários acima de média nacional, jovens e estudantes, é mais crítico que a média e não dependente dos programas de compensação social. É o setor que politicamente rompeu com PT no passando recente, que não confia no PSDB e que também não é abarcado pelas alternativas da chamada esquerda socialista. É composto por setores que ainda votam “criticamente” em “petistas históricos” até parcela do eleitorado que “não tinha em quem votar” ou iria votar em branco e nulo. 

Soma-se a este perfil, outro com características comuns ao perfil do eleitorado típico (urbano e jovem) e opostas (conservador em relação aos costumes e mais despolitizado), formado por setores pentecostais. Marina pode absorver ainda parte do eleitorado padrão do PSDB, sem a imagem da “herança maldita” dos tucanos, trabalhada eleitoralmente pelo PT já há quatro eleições. Em resumo, Marina pode se apresentar como a imagem da “petista” sem o PT e da tucana sem o PSDB.

Reside na “união” destes dois aparentes contraditórios o grande trunfo eleitoral de Marina. Num eventual segundo turno ela canaliza para si uma parte dos votos de setores que historicamente votavam no PT e uma parte do eleitorado que historicamente sempre foi avesso ao PT, mesmo com sua guinada à direita e que jamais votará em Dilma, por mais “concessões” que ela faça. Essa possibilidade isola o PT ao chamado “lulismo” (trabalhadores desorganizados e precarizados, dependentes dos programas de compensação social, o chamado eleitorado menos ideológicos) e a parte da burguesia nacional (internacionalizada), de pequena densidade eleitoral, mas de grande poder de financiamento de campanha e de controle direto sobre os grandes meios de comunicação. 

Soma-se a tudo isso, o índice ainda alto de rejeição de Dilma, entorno de 34%, enquanto Marina seria rejeitada por apenas 11% do eleitorado, os dois extremos da pesquisa Datafolha em relação a este aspecto.

Ainda é muito cedo para conclusões mais definitivas. A melhora na avaliação no governo apontada também pelo Datafolha, o grande volume de financiamento de campanha, o tempo na TV, as assuntos que serão pautados pelas grandes mídias e o “fator Lula” poderão reverter o cenário em favor de Dilma e de Aécio. Mas, pela primeira vez em vinte anos, o PT e o PSDB não polarizarão uma eleição no país e é praticamente certo que um dos dois, não estará num segundo turno. Marina configura-se assim um terceiro polo nesta eleição e a torna completamente incerta, não podendo ser uma candidata a ser subestimada e sim, a ser batida.

*Direto para o blog Língua Ferina.
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