quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Comprei o Manifesto do Partido Comunista na farmácia


Por Silvio Kanner*

Comprei o opúsculo marxista numa rede de farmácias em Belém, o “clássico” “Manifesto do Partido Comunista”, hoje conhecido como Manifesto Comunista. A primeira impressão do texto, de Marx e Engels, em alemão, data do primeiro semestre de 1847, e foi impresso em Liverpool, Londres. Veio a publico, pouco tempo antes dos processos revolucionários de 1848.

Se alguém profetizasse a importância que o panfleto adquiriria ao longo da história, certamente seria ridicularizado. Mas o fato é que quase com certeza o manifesto foi a texto político mais influente desde a “Declaração dos direitos do homem e do cidadão”, dos revolucionários franceses.

Escrito como declaração política da recém criada “Liga dos Comunistas”, sucessora da Liga dos Proscritos, e embora contenha idéias de ambos os autores Clássicos do Marxismo o manifesto foi certamente quase que na integra escrito pelo próprio Marx, muito embora em 1914, o Vorwärts, órgão da social democracia alemã, publicou os “Princípios do Comunismo” redigido em 1847 exclusivamente por Engels, deixando supor se tratar de uma espécie de anteprojeto do manifesto, que posteriormente foi aproveitado e recebeu forma final de Marx.

Se alguém profetizasse que o texto contaria, até as vésperas da Revolução Russa, com centenas de edições, trinta traduções e milhões de exemplares, e se isso parecesse algo razoável, um dos seus autores talvez não tivesse sofrido tanto com dificuldades financeiras ao longo da vida. Talvez hoje, o número de edições, traduções e exemplares vendidos seja incontável. Marx não fazia idéia do volume de dinheiro que suas obras levantariam no futuro. E isso certamente não lhe interessava. Sem mencionar o fato curioso de uma profecia informando em 1847, data de seu lançamento, que esse livro seria o responsável por inspirar movimentos revolucionários que mudariam completamente o mapa do poder mundial, e que um dia seria vendido numa farmácia da América Latina.

Ele estava numa prateleira giratória, juntamente com outros títulos, de grande estatura, para citar dois: Política (Aristóteles) e A Republica (Platão). Traduz algo das grandes transformações econômicas e sociais pelas quais passamos nas últimas décadas a existência hoje de um mercado editorial amplo e não apenas isso, que um texto proscrito, combatido, contra o mercado, o capitalismo e a propriedade privada passasse a ser, também ele, uma mera mercadoria exposta no balcão de uma farmácia.

É um texto brilhante, já contém, embora produto de uma das primeiras fases do marxismo, todas as idéias fundamentais dos autores. Dois gigantes do pensamento moderno, atacados por centenas de tentativas de refutação, mais inscritos até hoje e enquanto houver capitalismo entre os gênios da humanidade. Já encheu milhares de páginas de polemicas, já alimentou milhões de debates e já conquistou também milhares de mentes e corações para a causa do comunismo. Hoje aparentemente muito distante da realidade da maioria das pessoas, identificado que está com a experiência do socialismo real da antiga União Soviética na hegemonia do individualismo, do ceticismo e da alienação.

O manifesto é o abre alas do marxismo, é o ponto editorial de inicio, de uma longa elaboração teórica, que até o momento nem sequer foi publicada na sua totalidade, se considerarmos as correspondências e os textos jornalísticos. Mas sua existência, ainda hoje entre nós, baseia-se no fato de que ainda tem muito a dizer aos dias atuais.

Se alguém me perguntasse, no caso de iniciar uma leitura de Marx, por onde começar, eu diria comece pelo Manifesto, ele ainda precisa ser lido, o sistema do capital ainda existe, ainda precisamos superá-lo, e em todo caso, você pode encontrá-lo disponível para a venda numa rede de farmácias de Belém. Não seria de se estranhar, não há remédio melhor para a doença capitalista, as indicações de solução contidas em sua bula e posologia.


*Mestre em Desenvolvimento Sustentável e Presidente da Associação dos Empregados do Banco da Amazônia – AEBA. Escrito com o apoio da análise do contexto de elaboração de dos impactos do texto no processo histórico realizada por Eric Hobsbawn, professor da Birkbeck College da Universidade de Londres e New School for Social Research de Nova Iorque. Texto integrante da Coletânea “Como Mudar o Mundo – Marx e o Marxismo Pg. 98-115.


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