sexta-feira, 18 de junho de 2010

1990 – Itália: Um título para um país unificado

Jeferson Choma, da redação*

Pouco mais de seis meses após a queda do muro de Berlim, um marco histórico que permitiu a reunificação da poderosa classe operaria alemã, a seleção da Alemanha consagra-se campeã na Itália, na copa de 1990.

Uma cena do excelente filme “Adeus Lênin” talvez retrate de maneira fiel a alegria daqueles dias. Nela, os moradores de Berlim dos dois lados do muro, já posto abaixo a marretadas, unem-se em uma única comemoração, vibrando com a vitória da seleção Ocidental. Isso mesmo, Alemanha Ocidental.

Até aquela copa ainda existiam duas “seleções alemãs”, embora, desde o fim de 1989, não existissem mais as fronteiras que dividiam o país.

Contudo, antes do muro ser derrubado pelo levante revolucionário das massas alemãs, as eliminatórias da Copa já estavam em disputa, com duas Alemanhas. Apenas a Alemanha Ocidental conseguiu se classificar. A unificação das duas seleções, porém, enfrentava outros obstáculos. A Fifa tem como regra reconhecer apenas federações nacionais (e não países). Portanto, a Alemanha só teria uma única seleção quando toda a federação ocidental incorporasse oficialmente a oriental. O que só aconteceu após o Mundial da Itália.

Mas antes de deixar de existir, a seleção oriental realizou uma série de partidas que foram marcadas, no mínimo, por uma irônica coincidência histórica. Nas eliminatórias de 1989, por exemplo, uma das últimas partidas da equipe foi contra a URSS, já em avançado estágio de desintegração. Seu último jogo nas eliminatórias foi contra a Áustria, país que na segunda guerra foi anexado à Alemanha. Por fim, pouco depois, em meados de 1990, a equipe disputou aqui no Brasil sua derradeira partida contra a seleção canarinho e foi derrota por um gol justamente do atacante... Alemão.

Deixando as ironias históricas de lado, a conquista do mundial teve um profundo impacto psicológico na Alemanha recém-unificada. Não há dúvidas que ela se tornou um dos instrumentos político-ideológicos mais importantes na reunificação. Uma Alemanha separada, e com uma numerosa classe operária dividida foi um dos horrores produzidos pelos criminosos acordos entre o imperialismo e Stálin, após a segunda guerra.

Divisão essa que também foi traumática no futebol do país e produziu absurdos, como por exemplo, o enfrentamento entre as duas seleções na copa de 1974. Uma partida cuja ressonância transcende a questão esportiva, tendo profundo impacto emocional e até político que é fácil de avaliar. A equipe ocidental, campeã daquela copa, acabou perdendo a partida, na única derrota do time comandado pelo genial Beckenbauer.

O fato lamentável foi que na copa de 90, o mundo, e especialmente os trabalhadores alemães, não puderam ver os craques de ambas as seleções reunidas, sagrando-se campeã. Algo, que talvez, pudesse somente ter acontecido numa unificação com base na preservação da propriedade social, sem a restauração capitalista, assim como chegaram a sonhar os protagonistas de “Adeus Lênin”, no final do filme.

* Publicado originalmente no Jornal "Opinião Socialista" em 2006 e no sítio do PSTU (
http://www.pstu.org.br/) por ocasião da Copa do Mundo da Alemanha.

Mais informações sobre a Copa de 1990*:

- País-sede: Itália

- Data: 08 de junho a 08 de julho de 1990

- Participantes: Itália, Tchecoslováquia, Áustria, Estados Unidos, Camarões, Romênia, Argentina, União Soviética, Brasil, Costa Rica, Escócia, Suécia, Alemanha Ocidental, Iugoslávia, Colômbia, Emirados Árabes, Espanha, Bélgica, Coréia do Sul, Uruguai, Inglaterra, Irlanda, Holanda, Egito.

- Final: Itália 0 x 1 Alemanha Ocidental (
Stadio Olimpico, Roma
)
- Curiosidades da Copa*:
- A Copa do Mundo de 1990 foi a 14ª Copa do Mundo disputada, e contou com a participação de 24 países. Num total de 112 países participaram das eliminatórias. Foram marcados 115 gols. Destes, 52 foram de bola parada;

- Esta foi a primeira Copa do Mundo de três nações: Costa Rica, Irlanda e Emirados Árabes; Outras seleções voltam a disputar um mundial após um longo período ausente: Egito (após 56 anos); Estados Unidos (Após 40 anos); Colômbia (Após 28 anos); Romênia (Após 20 anos); Alemanha Ocidental, Tchecoslóvaquia e União Soviética participaram da útlima copa do mundo, já que esses países deixaram de existir;

- A mascote da Copa de 1990 foi Ciao, um boneco que tinha as cores da bandeira italiana, e fazendo embaixadinha;

- A seleção brasileira, dividida por brigas internas, foi precocemente eliminada. Após passar com dificuldades pela primeira fase, apesar de 3 vitórias, o Brasil caiu nas Oitavas de F
inal, frente à Argentina por 1 a 0 (o gol foi de Claudio Caniggia, em uma única jogada genial de Maradona). Foi a pior campanha brasileira desde 1966.O técnico Sebastião Lazzaroni adotou o sistema com líbero, com dois alas, chamado 3-5-2, apontado por muitos analistas como contrário às características do futebol brasileiro. O time era acusado de buscar mais se defender do que atacar, sendo o jogador símbolo desta tática, naquilo que seria chamado de início da “era Dunga”;

- A Argentina se classificou em terceiro lugar em seu grupo. No jogo contra o Brasil, pelas oitavas de final, o lateral
Branco saiu dizendo que havia pedido água ao massagista da equipe adversária e, depois de beber, tinha ficado zonzo. Estranhou que a água dada a ele não fosse do mesmo frasco entregue a Maradona. Ficou preocupado e comunicou ao bandeirinha. Depois, na volta para a concentração, dormiu no ônibus e continuou sonolento no dia seguinte. A história, que parecia uma desculpa pelo fracasso da Seleção em campo, acabou sendo comprovada no início de 1993 pelo massagista argentino Miguel di Lorenzo. Ele confessou ao jornal El Clarín que, em sua maleta, havia dois tipos de água: uma para os argentinos e outra para os brasileiros. As garrafas foram entregues pelo técnico Carlos Bilardo;

- A seleção de Camarões foi a grande surpresa do mundial. Liderada pelo experiente Roger Milla, a equipe africana surpreendeu a Argentina, campeã mundial, e venceu por 1 a 0 no jogo de abertura da copa. Avançou até as Quartas de Final, com vitórias sobre a Romênia 2 a 0 e Colômbia 2 a 1 (com mais dois gols de Milla, que ao marcar seu segundo gol, tirou a bola do goleiro René Higuita), mas perdeu por 3 a 2 da Inglaterra
, em um jogo sensacional com viradas dos dois lados e dois pênaltis;

- Nas semifinais, ocorrem dois clássicos: Alemanha X Inglaterra e Argentina X Itália. No primeiro jogo, uma das maiores rivalidades da Europa, muito equilíbrio, e um empate em 1 a 1 com gols de
Andreas Brehme para o time alemão e Lineker marcou para os ingleses. A Inglaterra não chegava nas semifinais desde a Copa de 1966, quando foi campeã e, mesmo tendo um de seus melhores times em Copas com jogadores talentosos como Lineker, Paul Gascoigne, David Platt, Ian Wright, e o veterano goleiro Peter Shilton
, não conseguiu furar o bloqueio alemão e a decisão foi para os pênaltis, onde pesou a tradição da Alemanha, que venceu por 4 a 3 e chegou à sua terceira final consecutiva, um recorde inédito até então;

- "Desculpe Dieguito, nós te amamos, mas a Itália é a nossa pátria". Essas palavras expressavam o sentimento da torcida italiana no Estádio San Paolo, em Nápoles, onde Argentina e Itália se enfrentariam. Foi lá que Maradona viveu seus melhores dias na carreira. Começa o jogo, os i
talianos dominam e Schilacci faz 1 a 0. A Argentina se recupera em campo, mostra um futebol e uma auto-confiança que não mostrara e Caniggia empata. O empate persiste na prorrogação e a decisão da vaga também vai para os temidos penais. A torcida napolitana torce para que, só desta vez, Maradona erre o pênalti, mas ele marca. Goycochea brilha, defende dois pênaltis e a Itália, anfitriã e talvez a maior favorita ao título no início da competição, dá adeus ao tetracampeonato;

- No Estádio Olímpico de Roma, a Alemanha Ocidental de
Lothar Matthäus e a Argentina de Maradona fariam a revanche da Copa de 1986. Maradona, El Pibe de oro, que já era "odiado" pelos torcedores romanos por sua atuação em Nápoles, se vingou, chamando palavrões para a torcida, que vaiou o hino argentino. Ele se tornou um dos mais hostilizados pela torcida devido à eliminação italiana na semifinal. Os argentinos buscavam o tricampeonato mundial mas, depois de dois vice-campeonatos consecutivos, a Alemanha não deixaria o título escapar e domina amplamente a partida. A Alemanha conquistava o tricampeonato. Franz Beckenbauer se torna o primeiro europeu (e o segundo campeão de Copa do Mundo) a ser campeão do torneio como treinador e jogador. Apesar do gol do título ter vindo de um lance duvidoso, o título germânico foi incontestável. Lothar Matthäus recebeu, ainda em 1990, a Bola de Ouro e o prêmio de Melhor Jogador do Mundo. A Copa de 1990 serviu também como uma homenagem simbólica a um país que seria reunificado poucos meses depois;

- O ritmo musical que tomou conta do Brasil na época da Copa foi a lambada, dança criada no norte brasileiro (especificamente no Pará) nos anos 1970. O Brasil chegou aos anos 1990 dançando o ritmo em bailes, festas de aniversário, casamento, festas juninas, entre outras. Durante a Copa do Mundo, a moda dançante brasileira se espalhou pelo mundo graças aos comandados de Lazaroni. Depois de abrir o placar para o Brasil na estreia contra a Suécia, o atacante Careca correu em direção à bandeira de escanteio e ensaiou passos de lambada. O gesto intrigou os jogadores de outras equipes e a partir daí, os torcedores passaram a aguardar a lambada dos brasileiros. O ponto máximo do gesto porém veio na primeira partida das oitavas-de-final entre Camarões e Colômbia no Estádio San Paolo, em Nápoles. Quando marcou os dois gols da vitória de 2x1 dos Leões Indomáveis sobre os colombianos, o atacante Roger Milla imitou Careca nas bandeirinhas de córner e o ritmo passou a sacudir o Mundial e o resto do planeta, que ficou bastante interessado na lambada.

*Fonte: Wikepédia



- Leia o que já foi publicado aqui no blog sobre a história das copas:
1930 - Uruguai: A bola rola, com o mundo em frangalhos



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