domingo, 1 de junho de 2008

Acre é denunciado no TRF pelo uso de cobaias humanas

Ação pede à Justiça que determine ao governo do Acre paralisação imediata de pesquisas.

BRASÍLIA – O uso de agentes entomológicos da saúde pública como cobaias humanas em pesquisas de malária na região do Vale do Juruá foi parar na Justiça do Acre. A Associação Brasileira de Apoio e Proteção aos Sujeitos da Pesquisa Clínica (Abraspec) ingressou na quarta-feira no Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região com ação civil pública contra a União Federal e o governo do Acre.
Em 2003, o governo acreano contratou para as pesquisas diversos agentes de endemias. Nove agentes confirmaram o caso. Eles passaram a auxiliar serviços de entomologia (parte da zoologia que trata dos insetos, insetologia). Suas tarefas consistiam em estudar os tipos de mosquitos anofelinos transmissores da malária. Recebiam, em média, R$ 850 pelo serviço.

O Ministério da Saúde autorizou o registro de funcionamento de dois comitês de ética em pesquisa com seres humanos no Acre, em 2001 e 2005. Um deles é vinculado à Fundação Hospital Estadual do Acre (Fundhacre), outro, à Universidade Federal do Acre (Ufac). Ignora-se qual deles se responsabilizou pela consolidação dos resultados do estudo dos tipos de anofelino que atacam no Vale do Juruá, onde ocorre a maior incidência de malária no estado. Se houver condenação, o governo terá que indenizar os agentes. A indenização seria pecuniária, em razão de dano moral. “Um lenitivo que atenua, em parte, as conseqüências do prejuízo ou dano sofrido”, assinala a Abraspec. A ação classifica de “conduta omissiva dolosa” a possibilidade de o governo acreano “inflar os números de malária para conseguir mais dinheiro do governo federal”.

O governo estadual está sujeito a devolver aos cofres da União todo o dinheiro recebido nos últimos cinco anos, com a repetição do indébito, originariamente recebidos para combate à malária.

“Prática nefasta”

Um dos agentes, Marcílio da Silva Ferreira, contou que se submetia a picadas com o corpo nu, até por 12 horas, durante o dia, à noite e nas madrugadas. Ferreira disse que precisava do dinheiro, mas não escapou de contrair 12 malárias. Outros agentes confirmaram à Defensoria Pública, em Cruzeiro do Sul (a 710 quilômetros da capital ao Acre), que se submeteram às pesquisas há mais de três anos. O agente Jamisson Rodrigues foi demitido pela Secretaria Estadual de Saúde após relatar a situação à Defensoria.

Assinada pelo presidente da entidade, advogado Jardson Bezerra, a ação pede antecipação de tutela. “O que ocorre no Acre se assemelha ao nazismo e holocausto dos tempos de Adolf Hitler, e não se pode aceitar a continuidade dessa prática nefasta”, reafirmou Bezerra na ação. Em nota oficial divulgada três dias após a primeira denúncia, a secretaria negou a prática.

“A atração humana é a técnica de captura do mosquito feita sem o contato direto com a pele, coletando-o no momento em que pousa, com proteção dada pelo uso de barreiras mecânicas como fardas adequadas e demais equipamentos de proteção individual”, alegou. A Abraspec refuta: “O órgão subestima a exposição dos seus agentes entomológicos às picadas do mosquito, conforme eles próprios relatam”. Para a entidade, eles foram iscas.

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