quinta-feira, 26 de junho de 2008

Acorda Brasil: tão levando a Amazônia!


Quem minimamente conhece a história recente da “ocupação” da Amazônia sabe que com o lema de “uma terra sem povo para um povo sem terra” o regime militar assegurou a formação dos maiores latifúndios que a história da humanidade já viu. Essa ação foi acompanhada de um discurso ideológico convincente: a realização da Reforma Agrária, pauta efervescente no período.

Não por caso, a ditadura planejou uma faixa de colonização destinada a pequenos agricultores migrantes ao longo de 10 quilômetros de cada lado de rodovias como a Transamazônica e a BR-163 (Cuiabá-Santarém). A massa camponesa que demandava terra no Sul, Sudeste e Nordeste não viriam a Reforma Agrária prometida ocorrer nos intocáveis latifúndios locais. Ao mesmo tempo, os camponeses da Amazônia foram desconsiderados como seres humanos e quando muito, teriam que se “enquadrar” em lotes de 100 hectares da colonização ou ainda em áreas menores, de uma dita “regularização fundiária”, moldando-se a um modelo produtivo que não era o seu.

A função de toda essa gente nesse processo era servir de mão-de-obra barata para projetos agropecuários, em áreas licitadas atrás das faixas de colonização, em lotes de até 3.000hectares, limite imposto pela Constituição de 1967. Em uma dessas áreas, no lote de número 55, na Gleba Bacajá em Anapú, seria assassinada a freira e missionária Dorothy Stang em 2005. O trabalho também era necessário em áreas maiores griladas e nos projetos de abertura de rodovias, construção de hidrelétricas e outras obras de infra-estrutura.

Percorrendo a Transamazônica e a BR-163, em municípios como Pacajá, Brasil Novo, Uruará, Novo Progresso, Medicilândia, Ruropólis, Castelo dos Sonhos e tantos outros, qualquer brasileiro que se disponha a conversar com os moradores destas cidades perceberá um misto de dor e ilegalidade que formaram essas localidades. São histórias terríveis como de trabalhadores de um projeto sucro-alcooleiro que tiveram as línguas cortadas durante uma greve contra a precariedade do trabalho; mulheres que foram espancadas por milicianos de grileiros até o aborto; índios que em poucas semanas tiveram toda a sua população reduzida por doenças trazidas pela “frente pioneira”.

Hoje, ao se falar do desmatamento, poucos associam esses fatos. Vê-se as conseqüências da penetração do grande capital na região como um simples “problema das árvores” e não do mosaico humano que hoje forma a Amazônia.

Mas, ignorar o passado e não vê-lo no presente não é um simples problema de desconhecimento da história ou da memória do Brasil sobre a região Norte. Se o passado não existe, ele também não serve de lição ao futuro. Parece ser essa a lógica que prevalece na definição das políticas para a Amazônia na atualidade.

Essa ignorância é na verdade a cumplicidade com o maior saque que as florestas e os povos da Amazônia estão passando. Somente no Pará, há em curso dezenas de grandes projetos como hidrelétricas, rodovias, mineração, concessão florestal e privatização de terras.

Os governos petistas de Lula e Ana Júlia Carepa põem em curso as engrenagens para um cenário tenebroso num futuro bem próximo. Com discursos, documentos e propaganda de “ordenamento territorial”, “sustentabilidade” e “governança” promovem a maior entrega das águas, subsolo, terras e florestas que o Brasil já viu.

No que se refere à questão agrária, poucos sabem, mas quase toda a Amazônia brasileira é formada por terras públicas. São áreas ainda devolutas e uma maior parte já arrecadada pelo Incra ou pelos Institutos estaduais de terras. Algumas dessas áreas estão destinadas para Terras Indígenas, Unidades de Conservação e Projetos de Assentamentos, situação que não impede a apropriação privada por grileiros, madeireiros e agropecuaristas.

Não raro, Unidades de Conservação foram criadas para instalação de grandes empreendimentos de mineradoras ou para exploração florestal, desconsiderando as populações que moram nessas áreas. Hoje, outras unidades de conservação que beneficiariam essas populações (caso das Reservas Extrativistas) são engavetadas na mesa da Ministra Dilma Russef para não “atrapalhar” a construção de hidroelétricas e a instalação do grande capital.

A avalanche de assentamentos sem assentados no Oeste do Pará, longe de representar uma distribuição massiva de terras e a destinação do território aos povos das florestas, foi apenas o preâmbulo de uma afinada orquestra. Área destinada é área passível de instalação legal de grandes empreendimentos, mesmo que essa legalidade seja apenas de verniz.

Põe-se em curso no momento a “regularização fundiária” de grandes áreas no Pará. O Incra poderá regularizar ocupações em suas terras em até 1.500 hectares. Em detrimento disto, o reconhecimento de comunidades quilomboloas, o reassentamento de não-indígenas e o reconhecimento de populações tradicionais de Unidades de Conservação já criadas ficarão em segundo plano. Por outro lado, o Iterpa promete em documento público “regularizar” até o limite constitucional de 2.500 hectares.

Escritórios de grilagem auto-denominados “corretoras” correm contra o tempo para ajustar em campo novos limites de áreas griladas. Áreas de 500hectares são travestidas para 1.125 ou 1.124,90, para não deixar margem para outras interpretações.

Quem olhar para o que ocorreu na região nos setenta e hoje vê o que ocorre poderia pensar que a história se repete. Se a repetição histórica é uma fraude, o que ocorre na região nada mais é do que isso. Com uma diferença: os militares mentiam na suas intenções, mas não faziam delas nenhum discurso bonito como “plantar um bilhão de árvores”.

Os indígenas em Roraima e da região do Xingu parecem que acordaram e estão numa luta ferrenha de defesa de seus territórios. A grande mídia, parte desse processo de entrega, só aborda essas lutas para criminalizá-las.

Está passando da hora dos brasileiros não-amazônidas acordarem para o quem vem acontecendo na região. Há pouco menos de dois anos por aqui, estou impressionado com o profundo silêncio nacional com fatos tão graves que a cada dia se sucedem.

Cândido Cunha, Eng. Agrônomo, Santarém, Pará - com especial agradecimento aos autores do livro Amazônia Revelada - Os descaminhos ao longo da BR-163.
Comentários
11 Comentários

11 comentários:

Anônimo disse...

Isso não é uma radiografia, é um retrato fiel do que acontece nessa região.

Anônimo disse...

Onde estão os dados? Onde estão as provas de que isso acontece? Segue a teoria da conspiração armada pelas elites.

Anônimo disse...

Ao anônimo:
Os dados estão numa simplória observação a sua volta, da simples análise da forma de se "ter terra" nesta região, . As provas de que iss acontece estão: Na escacez de propriedade titulada. Sugiro que faça uma pesquisa da quantidade de terrenos com título e depois nos conte. As provas de que isso acontece estão: Sócios das grandes madeireiras tratam-se sempre: ou de pessoas de naturalidade não amazônida,ou de pessoas de sobrenome pertencente ao Congresso Nacional, ou de pessoas utilizadoras da extração madeireira sem permissão. No capital social das madeireiras, números com zeros a perder de vista. Exportadoras de Madeira com lucros no topo do ranking nacional. Basta verificar. As provas estão em denúncias devidamente formalizadas nos òrgãos da justiça. As provas estão no olhar do caboclo da amazonia. Obviamente que a elite da qual suponho o senhor(a) fazer parte não olha nos olhos do caboclo, afinal de cima é dificil mesmo enxergar o que querem dizer, eu entendo vossa senhoria, entendo perfeitamene é dificil mesmo! é fato público e notório que o interesse da Administração Pública é e sempre foi nos abundantes recursos naturais desta região: quer demonstrações: A BR 163 sai agora para servir o escoamento da soja, orçamento dos órgãos federais corrigem astronomicamente para melhorar a amazonia, porém a estrutura devastadora de madeira e a possibilidade zero do amazônida pobre interferir se manteêm , etc etc etc...
E somente aproveitando a oportunidade vale dizer ainda que não se trata de teoria de conspiração armada pelas elites caro(a) anonimo. Ao meu ver teorias de conspiração nos dizem que um grupo de pessoas conspirou para manipular um evento ou uma série de eventos, para alcançar os resultados que eles querem mantendo segredo.Será que nós somos paranóicos ou realmente acontecem coisas que não sabemos? Alguns sugerem que nós precisamos de teorias de conspiração para explicar eventos que vão além do nosso controle. Porém o que ocorre aqui não tem nada de conspirado, nem de secreto. Decerto que existem elementos para sua afirmação caírem por terra,tais quais: num simples sobrevoô de 1 minuto na floresta, numa simples visita a Assentamentos, num ato da elite olhar para baixo.

Cândido Cunha disse...

Amigo anônimo, quando fiz o agradecimento no final do texto pensei que estava explícito que daquela obra havia retirado a maioria das informações. Mas se você as acha pouco, sugiro que vá a uma boa biblioteca e faça uma leitura de obras básicas sobre a Amazônia. Poderia também, caso seu intelecto seja averso a esse tipo de prática, passar pelos locais que citei, e conversar com as pessoas desses locais, o que não lhe deve causar conforto físico e de consciência. Por fim, poderia ainda postar de um outro local, quem sabe de um cyber, para eu não saber realmente quem seja (é possível identificar o número do que computador por aqui!)
Recomendações.
Cândido.

Anônimo disse...

Vocês estão todos comprados pela Alcoa. TODOS vocês da ASSERA e TODOS os autores do livro Amazônia Revelada, que não li por que não tenho tempo pra perder com afilhados da Alcoa.
Por que ninguém ataca a Alcoa e esses mesmos ficam jogando pedras no ex-superintendente.

Anônimo disse...

vamos enriquecer este nobre blog com críticas a alcoa!
que de fato merece observações contunedentes!
vossa excelência caro anônimo poderia puxar a fila!!!

bertold brecht disse...

Candido, parabéns pelo texto!

Anônimo, poense nisto: O que não sabe é um ignorante, mas o que sabe e não diz nada é um criminoso.
E nisto tb: Quem não conhece a verdade não passa de um tolo; mas quem a conhece e a chama de mentira é um criminoso!
Logo anonimo como sei que vc não é ignorante em relação à verdade expressa no texto só crer que é criminoso!

Cândido Cunha disse...

Valeu pelos elogios e críticas.
A prática é o critério da verdade.

Anônimo disse...

Prezado Cândido,
Sou isento na questão. Sou desinformado, mas pergunto se a coisa é assim. se existem assentamentos vazios com madeireiros dentro, se existe um monte de grilagem e uma nova lei que ajuda eles e tudo mais o que vc fala, eu pergunto por que não tá tdo mundo preso. Um assentamento vazio com madeireiro dentro não é nada que de pra esconder. É fácil de mostrar e se o Incra continua dizendo que não tem, é por que não deve ter sido provado.
Entenda que não estou duvidando de você. apenas acho que se tivesse mesmo isso, não seria possível eles esconderem, viria a público e estaria todo mundo preso.
Gostaria muito de ouvir você e seus leitores sobre isso.
Muito obrigado,
Rogério Heleno

Arnaldo José disse...

alguém lembra das reportagens da Record? pelo amor de Deus, precisamos de justiça pra ver o óbviu? um exemeplo básico é o juíz agrário de minas gerais q foi preso na operação joão de barro, uma vergonha... por isso que em minas naum se desapropriam terras, somente as compram. O judiciário está na maioria das maracutaias.

Anônimo disse...

eu gostei
desse assunto
pq muitas pessoas
não conheçem a amazônia
muitas pessoas moram na propia amazônia e elas mesmas não conheçem oq e delas por direito..........